Consequências de desvincular trabalhadores especialmente protegidos
TRABALHADOR QUE ESTEVE "RECENTEMENTE" CERTIFICADO POR DOENÇA
O Decreto-Lei 14.407 procura evitar que o trabalhador que se ausenta por doença seja privado de seu trabalho por essa razão. Diante disso, o empregador é obrigado a reintegrar às suas atividades habituais o trabalhador que se ausentou por motivos de doença - devidamente justificada.
Nesse mesmo sentido, a norma proíbe em princípio sua demissão durante a doença e mesmo depois, até decorridos 30 dias de trabalho efetivo desde o retorno às suas atividades habituais (não se contam, por exemplo, dias de licença anual ou seguro desemprego).
Em virtude disso, se o empregador decidir não reintegrar o trabalhador uma vez obtida a alta médica ou o demitir dentro do prazo estabelecido, presume-se que a demissão foi motivada por essa doença, e conforme a norma estabelece, deverá pagar uma indenização por demissão equivalente ao dobro do normal.
Isso ocorre sempre que se trate de trabalhadores permanentes, que tenham direito à demissão. Se não houver direito à demissão, não corresponde a indenização especial. De acordo com os critérios jurisprudenciais majoritários, nos contratos por prazo determinado ou por obra, uma vez finalizado o prazo ou concluída a obra, não há obrigação de indenizar o trabalhador por nenhum motivo, porque o término se dá por outras causas (ex. esgotamento do objeto do contrato). Ou seja, também não se aplica a demissão por doença, pois justamente não há demissão.
No entanto, apesar desse impedimento legal, existem hipóteses excepcionais. Uma delas é que a demissão não esteja diretamente ou indiretamente relacionada à doença. Um exemplo disso poderia ser que obedecesse a uma necessidade real e comprovável de prescindir desse posto de trabalho, ou uma reestruturação na empresa. A outra exceção é o caso da desvinculação por notória má conduta (ver: http://www.castellan.com.uy/es/noticias/17/iquest-cuando-la-conducta-del-trabajador-es-quot-notoriamente-mala-quot.html).
Em suma, essa indenização extraordinária não é gerada automaticamente pelo fato da demissão, mas o empregador poderá comprovar motivos que o isentem de seu pagamento e em um eventual processo essas razões serão consideradas.
DOENÇA PROFISSIONAL OU ACIDENTE DE TRABALHO
De forma semelhante aos casos de doença comum, também a Lei 16.074 procura proteger o trabalhador que sofreu um acidente de trabalho ou uma doença profissional, concedendo-lhe o direito de ser readmitido no mesmo cargo que ocupava, uma vez dado alta pelo órgão competente (BSE), ou em caso contrário, em qualquer tarefa compatível com suas capacidades.
A contrapartida desse direito é a obrigação do empregador de reintegrá-lo dentro dos 15 dias seguintes à alta, e a proibição de demiti-lo dentro dos 180 dias de ter se reintegrado.
Então, quais são as obrigações e sanções? Se o trabalhador não for reintegrado após a licença subsidiada pelo BSE, terá direito ao recebimento de uma indenização equivalente ao triplo da demissão comum.
No entanto, a Lei nada diz sobre qual é a consequência da violação da obrigação de não demitir o trabalhador dentro dos 180 dias após o reintegro (prazo de estabilidade). Nesse sentido, a jurisprudência elaborou diferentes interpretações, sendo atualmente majoritário o critério que considera que o trabalhador deve receber os salários restantes até que se completem 180 dias de seu reintegro ("salários caídos") mais a indenização por demissão comum. Por exemplo, se o trabalhador acidentado for reintegrado e desempenhar tarefas por um período de 40 dias após a alta, a indenização que corresponderia seria: a demissão "normal" mais 140 dias (que faltariam para completar os 180 de estabilidade).
As mesmas considerações sobre a demissão em situação de doença comum se aplicam a esse caso no sentido de que se o trabalhador não tem direito à demissão, também não corresponde a indenização especial.
Tampouco deve ser paga qualquer indenização se a demissão encontra seu motivo na notória má conduta do trabalhador ou outra causa grave superveniente. Essas são as duas únicas exceções previstas de forma expressa na lei. Esse conceito de "causa grave superveniente" é bastante mais restritivo. Causa grave superveniente tem sido interpretada como sinônimo de força maior, ou seja, uma situação imprevisível e não imputável ao empregador, sendo a norma mais protetora ainda no caso do trabalhador que esteve amparado pelo subsídio por uma doença de origem profissional ou um acidente de trabalho (inclusive como vimos o prazo de estabilidade é maior).
TRABALHADORA GRÁVIDA OU MÃE RECENTE
Como é sabido, a Lei 11.577 reconhece o direito da trabalhadora de se ausentar durante o tempo que durar a licença maternidade, e em consonância com isso também impõe ao empregador a obrigação de conservar o emprego enquanto ela estiver grávida, e mesmo depois de se tornar mãe e se reintegrar. A norma estabelece uma proteção em ocasião da maternidade e proíbe então sua demissão, estabelecendo que em caso de infringir essa proibição deverá ser paga uma indenização especial equivalente a 6 meses de salário, mais a indenização por demissão que legalmente corresponda.
Quanto ao prazo, a lei citada não estabelece um período de estabilidade durante o qual essa proteção esteja vigente. No entanto, doutrina e jurisprudência têm entendido que a mesma deve se estender por 180 dias, contados a partir do efetivo reintegro da trabalhadora de sua licença materna (assimilando essa situação à prevista pela Lei 16.074).
Deve-se destacar também que, embora a disposição legal não estabeleça nada a respeito, na prática e em decisões judiciais, é amplamente aceito que, para que proceda a referida indenização é necessário que o empregador tenha conhecimento do estado de gravidez da trabalhadora (seja porque é notório ou porque pode comprovar que foi comunicado).
Neste caso, ao contrário das duas hipóteses vistas anteriormente, aplica-se a proteção especial em análise, independentemente de a demissão ter ou não sua razão nesse estado e inclusive a jurisprudência entende que corresponde a indenização dos 6 salários, quando não corresponde à demissão (por exemplo durante o período de experiência). Em resumo, não importa o motivo e independentemente do direito ao recebimento da demissão comum será aplicada essa proteção, exceto uma única exceção: a notória má conduta. Não há nessa hipótese nenhum excludente relacionado à empresa.
TRABALHADOR VÍTIMA DE ASSÉDIO
Até o momento, apenas está regulamentada a situação do trabalhador vítima de assédio sexual. A Lei 18.561 estabelece que o trabalhador pode optar entre reclamar do empregador uma indenização especial por dano moral e continuar trabalhando, ou em caso contrário considerar-se indiretamente demitido e reclamar uma indenização equivalente a seis mensalidades, acumulável à demissão comum.
Por outro lado, a Lei dispõe que tanto o denunciante quanto as testemunhas não poderão ser objeto de demissões ou sanções disciplinares. Se forem demitidos ou sancionados dentro dos 180 dias após a denúncia, será considerado, salvo prova em contrário, que obedecem a motivos de retaliação e a demissão poderá ser qualificada como abusiva, dando direito à indenização especial mencionada anteriormente. Em suma, este também é um prazo de "proteção".
Nesses casos, o empregador também poderá se eximir de responsabilidade provando que a demissão não foi motivada pela denúncia ou pelo depoimento prestado no âmbito da investigação, mas sim por outra razão diferente.
Por último, cabe ressaltar que embora atualmente não tenhamos uma Lei específica para os casos de assédio moral ou "bullying" (existem vários projetos), a normativa aplicável ao procedimento de denúncia perante o MTSS é a Lei sobre assédio sexual e é de se esperar que a regulamentação seja em um sentido similar, estabelecendo medidas de proteção para o trabalhador denunciante e testemunhas. De fato e sem prejuízo da inexistência de uma normativa que assim disponha, poderia ser reclamada demissão abusiva, se a mesma fosse consequência da denúncia.
OUTRAS SITUAÇÕES QUE GERAM O PAGAMENTO DE DEMISSÃO ESPECIAL
Demissão como retaliação por denúncia no BPS. Além das circunstâncias mencionadas, a Lei 16.713 estabelece que a demissão de um trabalhador como consequência de ter feito a denúncia no BPS por irregularidades na informação que consta de sua história laboral, dá lugar a uma indenização especial igual ao triplo da demissão comum (neste caso não são acumuláveis). Presume-se que a demissão ocorrida dentro dos 180 dias após a observação ou "denúncia" por parte do trabalhador obedece a essa causa (salvo prova em contrário).
Demissão abusiva. A demissão abusiva se configura quando o trabalhador alega que o empregador lhe causou danos excessivos aos cobertos pela indenização por demissão comum. Os requisitos para que isso ocorra são a existência de uma causa contrária à lei, motivada por questões extralaborais, de abuso e/ou com intenção de prejudicar economicamente ou moralmente o trabalhador. Alguns exemplos de demissão abusiva podem ser a demissão por motivos raciais, religiosos, sindicais, sexo, orientação sexual, como retaliação por ter reclamado algum direito. A jurisprudência geralmente determina nesses casos a obrigação de pagar o dobro ou triplo da demissão comum (sem prejuízo da possível nulidade e alternativa da ação de reintegração no caso da demissão "antisindical").
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como foi dito, as normas citadas buscam proteger os trabalhadores que se encontram em situações de especial vulnerabilidade. As consequências da demissão nesses casos são mais severas do que as "normalmente" previstas. O valor da indenização aumenta consideravelmente, por isso, na prática profissional, esse aspecto adquire grande relevância na hora de avaliar a decisão e principalmente a oportunidade do desligamento de pessoal, que às vezes pode ser motivado por necessidades de redução de custos e no entanto, acarretar piores consequências (tanto do ponto de vista da incidência econômica quanto da conflitividade trabalhista).
Em algumas das situações mencionadas, esse direito a uma indenização especial se configura objetivamente pelo fato em si e em outras devem ser consideradas as verdadeiras razões da demissão (e é claro os meios de prova que o empregador possui para comprová-las).
Montevidéu, 15 de junho de 2016.